domingo, 14 de março de 2010

Ao toque sutil do tempo

Jornei Costa

A garota, enquanto olhava a chuva pelo vidro da janela, lutava para tirar uma casca de pipoca que se alojara sob a língua. O taxista olhava para todos os lados tentando identificar o seu próximo cliente. Próximo dali, um insistente repicar de sinos anunciava que a missa não tardaria a começar. Todos se movimentavam. Eram manifestações conscientes e inconscientes num vai-e-vem silencioso sob o acompanhamento invisível, mas implacável do tempo.

A lagarta, que ainda não era borboleta, aguardava calmamente o momento de dar o seu primeiro passeio fora de seu discreto casulo. Ao lado, a lesma subia o muro sem reclamar da sua pouca velocidade. A natureza rodava no compasso normal da rotação da terra. O ciclo da vida se repetia. Nada era estático. A pulsação do meu sangue e o tempo que transcorria dava-me a idéia clara da dinâmica de todas as coisas, dessa energia em que estamos imersos e sobre a qual não temos o controle de detê-la.

Na tentativa de confirmar algumas imagens cheguei a pensar em voltar, não foi possível, já era passado. O tempo, indiferente, seguia adiante. Tudo à minha volta continuava a acontecer. Percebi, pois, que o mundo era também um pouco nervoso e não está disposto a esperar. E, lá estava ele, o tempo: posicionado no alto como uma águia, ia fazendo seus registros numa contagem sem retorno.

Cheguei a pensar em brigar contra o tempo, mas os meus sensores alertaram-me do meu flash de irracionalidade. Foi quando então, numa situação de reflexo metafísico, ao invés de me contrapor, aliei-me a esse companheiro que nos acompanha e nos dá o sentido de passado, presente e futuro.

A garota olhava a casca de pipoca na ponta do dedo. No ponto de táxi, não havia taxistas. Os religiosos, já tinham exorcizado seus pecados e voltavam aliviados para casa.

Um comentário: